segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Nossos esquecidos, por Andrei Bastos

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O Natal está chegando, com essa coisa de festa consumista e confraternização universal ao mesmo tempo. Mas, confraternização universal até que ponto, gente boa? Quando ultrapassamos as grades e muros das “cidadelas” dos bem-nascidos, que a cada dia ficam mais vulneráveis e menores diante das não-cidades formadas pelas favelas e pelas comunidades pobres, ficamos assombrados com a invisibilidade total das pessoas com deficiência dos lugares além-fronteiras.
Depois que passei a priorizar e promover a interseção da questão da pessoa com deficiência com a da criança, diante da constatação óbvia de que a efetividade do combate ao preconceito e à discriminação é praticamente absoluta na infância, tenho participado de muitas atividades fora da área das deficiências. Juntando a tal posicionamento o fato de que a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência contempla as mais pobres dessas pessoas, estabeleci meu foco nas chamadas comunidades de baixa renda com a difícil equação deficiência/criança/pobreza.
Com essa “mala cheia de ilusões”, circulei pelas vielas da Maré, no Rio de Janeiro, e de Mangueirinha e Nova Campina, em Duque de Caxias, assuntando a exclusão social e os direitos humanos em seus múltiplos aspectos – da reintegração familiar e comunitária de crianças em situação de rua à violência praticada por polícia, tráfico e milícia contra cidadãos de bem, que ficam acuados e silenciados.
Nessa trajetória, estive presente em reuniões, manifestações e debates, sempre concorridos e de grande qualidade. Porém, assim como aconteceu na primeira audiência pública do Plano Nacional pela Primeira Infância no Rio de Janeiro, quando deixei mesa e platéia intrigadas ao me inscrever em todos os grupos temáticos porque era a única pessoa com deficiência participante, eu também me vi sozinho em todas essas ocasiões.
Diante disso, fiz duas perguntas. Uma, de mim para mim, questionando a própria luta pela inclusão das pessoas com deficiência que, em geral, fala para quem já está dentro dela, reforçando a idéia de gueto e podendo explicar a ausência de outros companheiros comigo. A segunda pergunta, para os militantes dos outros segmentos de excluídos, indagando se por acaso não existiam paraplégicos, surdos, cegos, paralisados intelectuais ou pessoas com síndrome de Down nas favelas, pois eu não tinha visto ninguém assim em nenhuma reunião ou viela.
Pois é, gente boa – é aí que o bicho pega! O pessoal começou a balbuciar, tentando se lembrar do garoto que queimou os olhos com algum produto e ficou cego, da menina com Down ou mesmo do rapaz que caiu da moto e ficou paralítico, mas todos tinham sumido na poeira das suas histórias.
É por essas e outras, Papai Noel, que aproveito este texto para pedir por todas as crianças, jovens e adultos com deficiência esquecidos nos labirintos de barracos, em meio aos ratos das palafitas ou adormecidos em cubículos precários nas pirambeiras.
Para nós, bem-nascidos da Zona Sul carioca, ou de qualquer outra “cidadela”, é muito fácil trabalhar e construir belos discursos contra o preconceito e a discriminação ou a favor das cotas no mercado de trabalho e da educação inclusiva. Difícil é combinar tais práticas com a luta contra a pobreza ou com a formulação de normas da ABNT para a acessibilidade nas favelas.

Com muita fé, desejo o Natal mais feliz possível para os nossos esquecidos!

* Andrei Bastos é jornalista e atua na ONG Terra dos Homens e na Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ

Fonte: Agência Inclusive

DEFICIENTE ALERTA foi criado para orientar,educar,protestar e ajudar todos com deficiência. www.deficientealerta.blogspot.com

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