terça-feira, 26 de abril de 2011
Estilista busca espaço no mercado com grife para pessoas com nanismo
Estilista Carina Casuscelli, de 32 anos, investe nas roupas desde 2008. Marca 'A moda está em baixa' teve 1º desfile em SP e busca entrar no Rio.
É com a mistura de dois objetivos, o de criar uma grife lucrativa com o da luta pela “democracia dos corpos”, que a estilista paulista Carina Casuscelli, de 32 anos, investe para que sua marca de roupas “A moda está em baixa”, destinada a pessoas com nanismo, ganhe espaço no disputado mercado da moda.
“Essas pessoas são reais e precisam se vestir (...). Acompanho as dificuldades da vida das pequenas. Elas trabalham em empresas, são mulheres vaidosas, mas não há peças para elas”, diz a estilista, que chama as anãs de pequenas, por uma "preferência delas”, explica. Democracia dos corpos é, para a estilista, uma moda que inclua todos, e não apenas um determinado tipo de corpo. Na lista dos que sofrem com a atual "ditadura da moda", ela inclui também gordinhos e deficientes físicos. "O projeto não tem só o teor mercadológico. Há o conceito artístico muito forte", diz Carina, que também trabalha como atriz e figurinista.
Caminhada
O projeto começou há cerca de dez anos. Diante da escassez de modelos para o público com nanismo nas lojas, a estilista passou a customizar peças para duas amigas "pequenas". “Eu ia com elas nas lojas, ajudava a escolher os modelos e fazia a customização”.
Carina explica que a principal dificuldade em encontrar roupas para as anãs está no fato de elas terem corpos de mulher adulta, mas baixa estatura. "Não é só questão da confecção, elas têm também dificuldade de encontrar sapato. Roupa ainda tem customização, pode costurar, mas e sapato? Jeans também é bem difícil", afirma.
Diante da dificuldade das amigas de encontrar roupas apropriadas, o grupo passou a fazer manifestações nas ruas. O nome “A moda está baixa” surgiu como uma espécie de protesto. “Eu fiz uns vestidos bacanas e roupas com estampas legais para a manifestação". De acordo com ela, as estampas, que eram com caricaturas divertidas de anãs, começaram a fazer sucesso entre o público que não tem nanismo. "A partir daí, passei a ter encomendas das peças que tinha confeccionado. Estudantes do Brasil todo começaram a me procurar”, afirma.
De olho nos negócios
Por conta da procura pelas peças, a partir de 2008 a estilista começou a vislumbrar um potencial para o negócio. De lá para cá, a estilista diz ter encontrado muita dificuldade, principalmente pelo preconceito do mercado. “Como não há concorrência, você fica à margem. Não há refêrencias anteriores. Aí, você tem que tem que dar a cara a bater”, diz, afirmando que já recebeu muito não, principalmente na hora de buscar patrocínio para os desfiles. "Por nunca ninguém ter feito nada parecido antes, eles ficavam um pouco assustados."
Carina conseguiu realizar o primeiro desfile no ano passado, em São Paulo, após ganhar um prêmio por conta de seus trabalhos pela diversidade nas artes. Com o dinheiro que conseguiu, montou o desfile. "O tema da coleção foi inspirado nos cabarés", diz.
Para o segundo semestre deste ano, a estilista planeja uma segunda exibição no Rio de Janeiro. A ideia é montar um catálogo e passar a vender as peças em algumas lojas da capital fluminense. Por enquanto, os modelos são feitos apenas sob medida e por encomenda. A estilista estima já ter vendido cerca de 400 peças. De acordo com ela, os preços são variados. Vestido, por exemplo, sai de R$ 80 a R$ 130, dependendo do modelo.
De acordo com a estilista, com o avanço dos trabalhos as coisas estão começando a deslanchar. A busca por patrocinadores, agora para o evento no Rio, continua. “Alguns empresários que já me disseram 'não' uma vez estão me ligando de volta. Há uma mutação no mercado”, diz.
Para ela, um dos motivos para a mudança é a própria atenção que o mercado de uma forma geral tem dado, cada vez mais, para a diversidade social e para a acessibilidade.
Por enquanto, contudo, o projeto ainda não dá lucro e a estilista investe de 40% a 50% dos seus rendimentos mensais no negócio. O dinheiro vai para produção dos desfiles, contratação de pessoal, como costureiras, e as mercadorias para a confecção das peças.
Mercado
Outro desafio encontrado por Carina é a falta de dados oficiais sobre o nanismo no Brasil - não há estimativas oficiais sobre a incidência de anões no país. De acordo com o médico Décio Brunoni, coordenador do centro de genética médica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), de cada 6 a 8 mil recém-nascidos, um nasce com a espécie mais comum de nanismo, que é a acondroplasia.
Além disso, não há uma estatura média, mas costuma variar de 1,20 m a 1,40 m para os homens e de 1,10 a 1,30 para as mulheres, diz o médico.
“Nós somos pequenos do tamanho de uma criança e, ao mesmo tempo, não temos corpo de criança”, afirma a advogada Kenia Rio, de 46 anos, que é presidente da Associação de Nanismo do Estado do Rio de Janeiro. A entidade está participando da organização do desfile que Carina pretende fazer na capital fluminense neste ano.
Kenia disse que a possibilidade de ter roupas personalizadas é bem vinda. “Tenho muita dificuldade em encontrar peças. Se eu engordo, então, pior ainda. Sapato, eu não consigo comprar. Quando encontro, compro vários de uma vez só. Isso me dá tristeza muito grande”, conta.
Apesar de ser casada com um homem que não possui nanismo, a advogada diz que o filho herdou a alteração genética. Para ele, que é atleta, Kenia diz também ser difícil encontrar roupas, já que é forte, mas baixo.
Para Carina, apesar de o projeto ainda vislumbrar somente as mulheres, a ideia é, no futuro, estender as peças também para o público masculino. "Muitos trabalham em escritório e precisam procurar peças no alfaiate", diz.
estilista, contudo, faz questão de lembrar que, apesar do foco mercadológico do projeto, nunca deixará de lado o conceito de protesto, iniciado com as manifestações. "As performances, isso para mim nunca vai deixar de existir", afirma.
Fonte: G1
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